sábado, 24 de março de 2018

PARTE III - DIREITOS POLÍTICOS DOS IMIGRANTES NO BRASIL: DESAFIOS E PERSPECTIVAS


Seguindo esta lógica da Constituição de 1988, portadora de um gama de direitos fundamentais e a assinatura pelo Brasil de diversos tratados internacionais de direitos humanos, BARALDI (2011), evidencia a incompatibilidade do Estatuto do Estrangeiro, o qual é inspirado na doutrina de segurança nacional, afirmando que esta lei trata o estrangeiro como um elemento perigoso, o que explica a necessidade de informação e justificação de cada movimento às autoridades nacionais.

A autora relata também que, apesar de o Conselho Nacional de Imigração (CNIG) promover diversas atualizações na legislação, as resoluções normativas adotadas por este Conselho não podem mudar o espírito da lei e nem mesmo excluir as disposições flagrantemente em conflito com a Constituição de 1988 e com os diversos tratados de direitos humanos dos quais o Brasil é signatário.





Diante disso, pode-se observar que o projeto de lei 5655/09 apenas enxerta a expressão direitos humanos em seu artigo 2º, e continua mantendo como objetivos perseguidos a defesa do interesse nacional e a preferência à mão-de-obra especializada no art. 4º. Entretanto, reflexo do período ditatorial e elaborada no âmbito da segurança estatal em detrimento dos direitos humanos, a legislação migratória do país em vigor continua sendo a Lei Nº 6.815 da década de 198016, o denominado Estatuto do Estrangeiro. Apesar de ocorrer, no final dos anos 80 o processo de redemocratização brasileiro com a promulgação de uma Nova Constituição, não foram representadas grandes mudanças no tratamento jurídico dos imigrantes.

Apesar de a nova Constituição de 1988 ser portadora de um grande elenco de direito fundamentais ao longo do seu texto, e o Brasil ser signatário de diversos tratados internacionais de direitos humanos, nota-se a incompatibilidade do Estatuto do Estrangeiro com o discurso brasileiro. Nesse sentido, é imprescindível debater sobre o fato de os imigrantes não possuírem direitos políticos (art.14 §2º e 3º da CF/88; art 107 da Lei 6815/80) e de seus direitos sindicais serem restritos (art. 106, VII da Lei 6815/80). Se aqui vivem, por que não possuem o direito de buscar políticas públicas e terem representantes? No entender Axel Honneth “O engajamento nas ações políticas possui para os envolvidos também a função direta de arrancá-los da situação. "




 Durante o período de vigência da Lei 6815/80, o Brasil deixou de ser um país de imigração para se tornar um país de emigrantes. Atualmente, estima-se que existam até três milhões de brasileiros vivendo no exterior. Mais recentemente, na última década, nota-se uma retomada dos fluxos de imigrantes para o Brasil, agora com significativa presença de sul americanos, o que transforma o país em um país de emigrantes e imigrantes, simultaneamente. (BARALDI, 2011, p.3) ,paralisante do rebaixamento passivamente tolerado e de lhes proporcionar, por conseguinte, uma autorrelação nova e positiva” (2009, p. 259). A vergonha social de não se sentir parte da sociedade é uma afronta aos Direitos Humanos, uma diminuição do respeito e estima do migrante. Nesse aspecto, Honneth ainda afirma que o engajamento individual na luta política Restitui ao indivíduo um pouco de seu autorrespeito perdido, visto que ele demonstra em público exatamente a propriedade cujo desrespeito é experienciado como uma vexação.

Naturalmente, aqui se acrescenta ainda, com um efeito reforçativo, a experiência de reconhecimento que a solidariedade no interior do grupo político propicia, fazendo os membros alcançar uma espécia de estima mútua. (2009, p. 260) Algumas propostas de atualização e aprimoramentos da lei migratória foram elaboradas17. Dentre elas, está o projeto de lei 5655/09. Apesar de, ao longo de seu texto, fazer menção a expressão “direitos humanos”, observa-se que ainda continua pautado pela lógica de gestão do Estado sobre o imigrante. Um exemplo disto pode ser encontrado no seu artigo 2º18 , na permanência do interesse nacional e a preferência à mão-de-obra especializada no art. 4º19:

  • A construção do texto do Projeto de Lei também ficou surda às demandas da sociedade que há anos denuncia os problemas do Estatuto do Estrangeiro e do tratamento dos imigrantes em geral.
Exemplo disso é a continuação da restrição de direitos políticos aos imigrantes em geral. Nesse particular, praticamente todos os vizinhos sul-americanos já avançaram em maior ou menor medida na garantia do direito ao voto para os imigrantes. Na lista dos 17 Concomitante ao Projeto de Lei 5655/09, há também, o Anteprojeto de Lei de Migrações e Promoção dos Direitos dos Migrantes no Brasil que foi elaborado por uma Comissão de Especialistas (criada pelo Ministério da Justiça pela Portaria n° 2.162/2013) e o PLS 288 (Senado). Aqui cabe mencionar também as Propostas de Emenda Constitucionais apresentadas visando conceder direitos políticos aos imigrantes: PEC n.29/1991, apresentada pelo PDS/RS; PEC n.72/1991, pelo PSDB/SP; PEC n.104/1995, pelo PL/RJ; PEC n.560/1997, pelo PPB/RS; PEC n.371/2001, pelo PFL/SP; PEC n. 401/2005, pelo PT/SP; PEC n.119/2011, pelo PPS/SP; e PEC n.25/2012, pelo PSDB/SP. 18 Art. 2º A aplicação desta Lei deverá nortear-se pela política nacional de migração, garantia dos direitos humanos, interesses nacionais, sócio-econômicos e culturais, preservação das instituições democráticas e fortalecimento das relações internacionais. Disponível em: 

codteor=674695&filename=PL+5655 /2009> Acesso em 29/04/2016 19 Art. 4º A política imigratória objetivará, primordialmente, a admissão de mão-de-obra especializada adequada aos vários setores da economia nacional, ao desenvolvimento econômico, social, cultural, científico e tecnológico do Brasil, à captação de recursos e geração de emprego e renda, observada a proteção ao trabalhador nacional. Disponível em:

codteor=674695&filename=PL+5655 /2009> Acesso em 29/04/2016 12 pontos negativos, deve-se computar ainda o aumento do tempo para o pedido de naturalização. É de quatro anos no Estatuto atual (art112) e passa para dez no Projeto de Lei (art.87, III). (BARALDI, 2011, p.

7) Nesta perspectiva, FERNANDES (2013) discute também sobre a relação entre o direito ao sufrágio e o grau de integração dos imigrantes na sociedade. Nesse ponto, cabe destacar que o voto, além de ser um direito básico nos Estados democráticos, garante voz e visibilidade para quem vive em comunidade. O autor ressalta que as vedações aos direitos políticos dos estrangeiros previstas também na Constituição não podem ser justificadas diante do atual cenário de globalização econômica e ausência de fronteiras para as informações e ideias políticas:

  • A restrição ao direito político impede que o estrangeiro participe plenamente da sociedade receptora, reduz sua capacidade de reivindicação social e jurídica, impossibilitando essencialmente o tratamento igualitário em relação aos nacionais.
A existência da restrição política, talvez seja uma das mais graves aos direitos dos estrangeiros, pois é aquela que lhes confere perpetuamente a condição de cidadão de segunda categoria, de pessoa que jamais poderá se integrar de forma plena à sociedade que o recebe. Se o imigrante reside na sociedade brasileira, qualquer alteração política, qualquer rumo que a política tome, tanto lhe afeta quanto aos nacionais brasileiros. Se não pode eleger e nem ser eleito, isso implica que o imigrante é uma pessoa sem representação política no Brasil, logo fora do conjunto denominado povo, pois este é o detentor do poder delegado aos representantes da nação e só o tem quem é povo:

  • "todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição" (art. 1, parágrafo único da Constituição Federal de 1988). (FERNANDES, 2013, p.97)". A partir destas considerações, é importante mencionar também a existência da Proposta de Emenda Constitucional para alterar os arts. 5°, 12º e 14º da Constituição Federal de 1988, com o fim de estender a esses indivíduos direitos inerentes aos brasileiros e conferir aos estrangeiros com residência permanente no país capacidade eleitoral ativa e passiva nas eleições municipais.
Trata-se da Proposta de Emenda Constitucional n° 25 de 2012, de autoria do atual senador Aloysio Nunes Ferreira: A proposta de Emenda Constitucional traria uma inovação de grande importância no tratamento jurídico do estrangeiro no Brasil. A concessão de direitos políticos em nível municipal, por mais que possa ser considerada tímida, pois não seria nenhum exagero se atingisse pelo menos o nível estadual, ou até mesmo o federal, é significativa diante de uma sistemática marcada pela restrição e total limitação a direitos políticos. (FERNANDES, 2013, p.101).

Seguindo esta lógica no âmbito da discussão da política migratória, SICILIANO (2013) compreende que não apenas o direito às atividades político-partidárias deve ser reconhecido, mas também o das filiações em sindicatos e associações políticas: 

  • Embora a Constituição Federal brasileira vede ao estrangeiro a participação política, desde 1991 foram apresentadas 8 Propostas de Emendas Constitucionais tratando do tema da outorga de direitos políticos aos estrangeiros residentes no país, o que demonstra que o tema da participação política do imigrante é objeto frequente de debate e que a situação atual, de negativa de direitos, não é satisfatória. (SICILIANO, 2013, p.46).
Nesse sentindo, destaca-se também a continuação da restrição de direitos políticos aos imigrantes em geral. Seguindo esta lógica, pode-se fazer uma análise comparativa com os países vizinhos do MERCOSUL, principalmente no fato de a maioria já apresentou grandes avanços na garantia do direito ao voto para os imigrantes, com diferenças no que se refere ao tempo de residência e ao nível políticoadministrativo das eleições em que lhes é permitido participar. Cabe mencionar aqui que a Argentina, Bolívia e Paraguai21 permitem a participação política do imigrante residente. O Uruguai permite ao imigrante o exercício do voto pleno, ou seja, em todos os níveis de eleições, desde que, dentre outras exigências, seja residente há pelo menos 15 anos. A possibilidade de serem eleitos, contudo, permanece restrita aos cidadãos nacionais e naturalizados.

Nas legislações da Argentina e do Paraguai, os estrangeiros, além de terem direito ao voto, também podem se candidatar a cargos eletivos na esfera municipal. Considerações Finais Observa-se assim que, em uma conjuntura marcada pela crescente globalização, com incremento do fluxo de pessoas entre as fronteiras dos Estados, uma revisão do quadro constitucional mostra-se necessária a fim de trazer resposta aos desafios impostos pela nova realidade. Dessa forma, é de extrema importância que se estudem essas questões para uma contribuição no debate de uma integração eficiente do imigrante no Estado 20 Exemplo de avanços significativos na concessão de diretos é a Lei de Migraciones nº 25.871/2004 da Argentina. Visando essa integração na esfera pública, reconheceu direito à participação política em seu art. 11, o qual dispõe:

La República Argentina facilitará, de conformidad con la legislación nacional y provincial en la materia, la consulta o participación de los extranjeros en las decisiones relativas a la vida pública y a la administración de las comunidades locales donde residan. Disponível em:

Acesso em 30/04/2016 21 Ver Lei Nº 978/96 de Migrações do Paraguai. Disponível em: Acesso em 30/04/2016 22 Ver Lei Nº 18.250 de Migracão do Uruguai. Disponível em: Acesso em: 30/04/2016 14 acolhedor e a formação de uma cidadania que não esteja somente pautada na nacionalidade do indivíduo. Pois, a plena igualdade com os nacionais, deve ser alcançada também por meio da participação do estrangeiro em assuntos públicos, conferindo-lhe não somente o direito a reivindicar, mas também o de se desenvolver como ser humano no âmbito do espaço público. Contribuindo assim, para que o imigrante possa agir participar e ter uma “voz ativa” na sociedade em que vive. Referências ARENDT, Hannah. As origens do Totalitarismo. São Paulo:

  • Companhia das letras, 1989. ____. A promessa da política.2.ed.Rio de Janeiro: DIFEL,2009. BARALDI, Camila. Cidadania, Migrações e Integração Regional: Notas sobre o Brasil, o Mercosul e a União Europeia. 3º Encontro Nacional da ABRI: Governança Global e Novos Atores. n.1. v.1, 2011. BENEVIDES, Maria Victoria de Mesquita.

“Direitos Políticos como Direitos Humanos”. Revista de Direitos Humanos. Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República, Brasília, 1ªed. 2010 BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF, Senado, 1998. BRASIL, Câmara dos Deputados. Proposta de Emenda da Constituição 347/2013. Altera a redação do § 2º do art. 14 da Constituição Federal e permite que os estrangeiros residentes em território brasileiro por mais de quatro anos e legalmente regularizados alistem-se como eleitores. Disponível em:

  • Acesso em: 29/04/2016. BRASIL, Senado Federal. Proposta de Emenda da Constituição nº 25, de 2012. Altera os arts. 5º, 12 e 14 da Constituição Federal para estender aos estrangeiros direitos inerentes aos brasileiros e conferir aos estrangeiros com residência permanente no País capacidade eleitoral ativa e passiva nas eleições municipais.

 Disponível em:


Acesso em 29/04/2016. BRASIL, Lei nº 6.815, de 19 de Agosto de 1980. Disponível em: Acesso em 29/04/2016. BRASIL, Câmara dos Deputados. Projeto de Lei nº 5.655/2009. Altera o Decreto-Lei nº 2.848, de 1940 e a Lei nº 10.683, de 2003. Revoga as Leis nºs 6.815, de 1980; 6.964, de 1981; 9.076, de 1995; o art. 1º do Decreto-Lei nº 2.236, de 1985; e o inciso 15 I do art. 5º da Lei nº 8.422, de 1992. Disponível em:

  • Acesso em 29/04/2016.

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